quarta-feira, 23 de setembro de 2009

Academia do Papo


Paulo Pires (*)

Na entrada da Vila Serrana

Antes da construção da Vila Serrana, havia na entrada daquele bairro um pequeno açude à beira da Avenida Brumado. O poço foi construído como bebedouro para o gado de uma fazendola de então. Os meninos dos bairros Sumaré e Iracema tão logo tomaram conhecimento daquele “maravilhoso açude” e resolvemos adotá-lo como nossa piscina, ou melhor, nosso parque aquático. Aos finais de semana nos reuníamos na Praça da Saudade para definir como e a que horas ir até lá. Para melhorar nossa vida de crianças soltas, descobrimos também o campinho de futebol de “seu” Genésio. Era tudo o que queríamos.

Depois de bater um belo baba (ou pelada, como se diz no Sudeste do Brasil), rumávamos para o açude com aqueles maravilhosos e, nem precisa dizer malcheirosos tênis TOPA TUDO. Alguns iam de Conga e os mais “ricos” de Basqueteira (eram os modernos!!!). A troupe marchava triunfante para “a piscina natural, pertinho do Remanso”. Foi ali e no Poço Escuro que começamos a dar nossas braçadas. Não lembro o motivo, mas o fato de nos proibirem de mergulhar no Poço Escuro nos fêz adotar definitivamente o açude da Vila Serrana. Hoje, infelizmente, só se vê o buracão onde antes era o açude. Pode crer, nadei muito ali com meus amigos de infância.

Tenho a sensação que aquele açude além de nos ajudar nas primeiras braçadas, serviu também como laboratório para imunização de muitas doenças brabas. Dos meus amigos de infância, não conheço um que tenha morrido de câncer ou coisa equivalente. Uma parte morreu de cirrose, outra de bala ou facadas e a terceira apresenta problemas cardíacos (meu caso). Mas aquelas doenças intestinais ou respiratórias ninguém tem. Não tenho dúvida que foi aquele açude, cheio de calangos e lagartixas mortos que nos imunizou.

Os meninos eram todos muito atentados (sendo eu um dos piores). Os nomes? Mirréis, Bakuta, Bisão, Tonhe, Silvano, Miltinho Tiotex (filho de Régis, respeitável zagueiro central do Humaitá) e outros que estão rolando pela cidade e pelo mundo. Como disse, o destino de cada foi se delineando conforme suas formações e preferências. Tinha um que era muito bom amigo. Um dia me perguntou se eu queria “ficar” com a irmã dele. Acho que engasguei na hora. Ficar? Foi a primeira vez que ouvi uma pessoa usando essa expressão para perguntar sobre “uma transa”.

Desconversei, mas meses depois entendi o motivo. O fato de tratar meu amigo muito bem - levando-o inclusive para tomar café na casa dos meus pais - o fêz sentir-se obrigado a me oferecer a irmã. Dias depois descobri a razão da “oferta”. Ciriu (era esse o apelido dele) me confessou que a irmã dele, como se dizia à época, “já estava furada” (expressão essa que sempre julguei de péssimo gosto).

Depois da oferta, pensei, medi as conseqüências, imaginei-a grávida, menino chegando a minha casa, minha mãe e meu pai me xingando e nessa hora, confesso, quase broxei. Tornei a pensar nela, sondei suas atitudes e, cá prá nós, constatei que “o material” não era de se jogar fora. Tímido, me mantive na retaguarda e preferi aguardar os acontecimentos.

Numa daquelas coincidências (cantadas por Castro Alves), em uma bela noite de verão conquistense e sem ter o que fazer em casa, fui até ao Magassapo. Acho que foi coincidência mesmo. Adivinhem quem encontrei? Isso mesmo: A irmã do meu amigo Ciriu. Ela, com uma saia curta e os lábios embotados de batom (cara de piranha mesmo!), abriu um sorriso prá mim que acabou me tirando do sério.

Cumprimentamos-nos e ela disse que estava ali agora, trabalhando. Entendo, respondi. Pediu-me sorrindo para entrar. Não sei se era a terceira ou quarta casa do lado direito de quem entrava no Magassapo (ainda está lá). Entramos e ela, mal nos sentamos, pediu logo um Bacardi com coca (é impressionante como as raparigas gostam dessa combinação!). Pedi um conhaque que entrou igual a uma luva.

Se não estou enganado, um velho guitarrista que até hoje mora na Rua do Tanque, tocava uns clássicos brasileiros como pano de fundo. Bebi mais uns dois conhaques e fomos para o quarto curtir “nossa lua de mel”. Não sei o que deu. Mas acho que ficamos tão contentes com nossa aproximação que quase não “mandamos brasa”. Foi uma noite (pedaço de noite) muito agradável. Saí de lá com a sensação de que tudo vale a pena se a alma é de uma morena. Na saída encontrei um dos amigos que nadavam comigo no açude da entrada da Vila Serrana. Sabe o que o safado foi fazer lá? Encontrar com a morena irmã do nosso amigo Ciriu. Nunca mais os vi. Nem ela, nem ele. Mas a entrada da Vila Serrana está lá. Toda vez que passo em frente me vejo mergulhando naquele açude e nos braços da morena. Tempo bom... Um abraço cordial e até a próxima.

3 comentários:

Anônimo disse...

Muito bom !.

AFRANIO GARCEZ disse...

Paulo Pires, mais uma vez você nós brinda com um exclente artigo, e ao que me lembro era isso mesmo, ou seja o termo para a desvirginada era "furada"!!! Quanto ao açude a que você se refere, eu fico na dúvida se pertencia a propriedade rural do Professor Everardo Publio de Castro. A proibição de tomar banho no açude do poço escuro, deu-se pelo fato de muitas mortes por afogamento tanto de meninos e jovens, como também de adultos, estes últimos geralmente iam tomar banho no açude completamente bêbados, e acabavam morrendo afogados, pois as águas represadas do Poçoço Escuro, eram escuras mesmo, e em grande volume. Valeu amigo.

Anônimo disse...

Fantástico! Você é fora de série.

Quase morro de tanto sorrir! Ciriu isso é que era amigo: oferece a irmã com saia curta, lábios embotados de batom e, além disso, furada! Bom demais. Pelo visto, você também não era brincadeira!
Pois é amigo, foi ontem. O tempo passou depressa, mas as boas lembranças do Magassapo, Poço Escuro, Mamoneira... ainda bem que ficaram.
Abraço,
Ezequiel Sena.