domingo, 1 de fevereiro de 2009

Academia do Papo


Famílias musicais

No último sábado (24/01/09) a TV Brasil reprisou uma entrevista com dois dos mais criativos e respeitáveis músicos brasileiros em todos os tempos: Sérgio e Badi Assad. A matéria, digna de ser assistida por toda a Nação, certamente só foi vista por meia dúzia de pessoas de bom gosto (desculpem-me a imodéstia: eu estava entre elas, claro!). Menino quem foi seu mestre, indagaria o Herzem. Os dois músicos [irmãos] que estavam na tela são simplesmente encantadores. Depois volto a falar do clã Assad.


A princípio não posso deixar de ratificar a qualidade de nossa música. Não o faço por ufanismo. Seria provinciano de minha parte. Reafirmo a grandeza e beleza de nossa música, não só pela identificação com os elementos telúricos que incorporam nossos conceitos estéticos, mas por todo o conjunto de manifestações vocais, instrumentais e corporais que compõem nossa sociologia musical, nossa antropologia cultural e nossas idiossincrasias pessoais. Corroboro a grandeza dessa música, sobretudo quando me permito confrontar o que produzimos de repertório e o que expressamos em nossas execuções instrumentais com o que é feito nos demais países. Sem brincadeira, em muitos casos, nossos artistas beiram a perfeição. Esse confronto de estoques produtivos nos permite avaliar com isenção o quanto somos criativos. E ainda podemos afirmar que: Tão importante quanto criativos, somos super abundantes e plurais na reinvenção de melodias, ritmos e variações harmônicas. Essa exuberância estética desde meados da década de 1950, passou a ser, com toda justiça, um dos poucos fatores de reverência em relação ao Brasil. É isso aí, a partir daquela década, em quase todos os quadrantes da Terra passaram a nos admirar pela excelência de nossa musicalidade.

Mas essa música não brota apenas das noites do Pantanal, das Montanhas de Minas ou das pancadas do Oceano Atlântico nas falésias da praia de São Conrado no Rio de Janeiro. Essa música é captada e moldada pelo cinzel dos artistas que a apreendem e a transformam em obras de arte. E esses artistas são seres humanos, que têm famílias para criar, sensibilidade para tocar, solidão para refletir, fome e outras coisas mais para alimentar. Eles aspiram e querem para a vida um mundo melhor. Quando pensamos neles, nos perguntamos como foi que chegaram aqui, o que os levou para esse campo de trabalho e porque escolheram essa profissão. Talvez a resposta mais comum seja a de que “comecei por influência de minha família”. É impressionante como as famílias no Brasil são musicais. Isso se explica porque nunca fomos um país triste [como nos interpretou o Dr. Lévy Strauss]. Ao contrário, somos um bando de gente alegre, tão alegre que até quando narramos um fato pouco agradável á nossa vida, zombateiramente rimos do nosso infortúnio.

Voltando à música, podemos afirmar que acima de tudo, somos um País de famílias musicais. Só no eixo Rio-Bahia-Minas-São Paulo temos a família Caymmi, família Jobim, família Souto Neto, família Godoy, família Assad e por aí vai. Em Conquista e Jequié são inúmeras as famílias musicais. Curioso é que aqui na ex-Terra dos Imborés, além daquelas famílias reconhecidamente produtoras de músicas, temos também as que não se aventuram na composição, mas que são extremamente musicais. Penso que dentre essas “não compositoras” está a família de nossos amigos Pedro, Ricardo e Luis Bitencourt Ferraz (todo o clã). Eles adoram música. Uma reunião na casa dos Bitencourt Ferraz é um verdadeiro sarau. Drª. Solange Laranjeira (esposa de Ricardo se integrou perfeitamente à musicalidade dos filhos de Dona Pombinha) e o resultado é música, boa música, muita música!

Das famílias produtoras no Planalto de Conquista, creio que a de maior expressão é a Figueira. E quem puxa o coral dessa grande família musical é o gênio da fonte pura Elomar Figueira. Antes, porém, temos que informar que os demais Figueira, principalmente os descendentes do pastor Waldomiro, formam uma escuderia de pianistas que merece a admiração de todos quanto as ouvem. Do clã de Elomar parece que Rosa e João Ernesto têm a música apenas como apetrecho do diletantismo. Em contrapartida, temos em cena o Maestro João Omar, que por si só já é uma orquestra de câmara, tal o seu virtuosismo em vários instrumentos. Ainda aqui em Conquista, temos a família Barros e o seu canto condoreiro que nos remete às canções de Violeta Parra e aos poemas de Gabriela Mistral. Em Jequié, penso que a família musical mais famosa e enfileirada é a Morbeck. Quase todos os membros dessa família são chegados à música.

Como o espaço é curto, peço licença aos senhores, para voltar ao clã Assad. Aquilo não é uma família musical. È uma fábrica. Uma poderosa indústria de fazer música de altíssimo nível. Pelo que vi, acho que até o totó da casa faz música. E o mais surpreendente: Música de um nível que eu acho que no mundo ocidental só os Strauss produziram tanta gente para fazer tanta música com tanta beleza em uma família só. Vale a pena comprar o DVD dos Assad. É uma oportunidade única para de ver, ouvir e – como diria dona Marta Suplicy – relaxar e gozar. Um abraço cordial e até a próxima.
Paulo Pires
(*) Professor UESB-FAINOR.

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