Construir destruindo
Na década de 1970, o grande Gilberto Freyre concedeu uma entrevista à extinta revista Realidade e na ocasião, ao ser solicitado pelo repórter como se situaria no âmbito de nossa intelligentzia, o autor de Casa Grande & Senzala, disse que se definia como um “anarquista construtivista”. Sim senhor, o grande Gilberto disse que era um homem de pouca crença nas instituições, mas mesmo assim, se considerava construtivista porque não havia outra saída.
Pessoas inteligentes são assim. Sabem que as coisas nunca são como deveriam ser. Mas, não vai ser por causa disso que devemos destruir o que existe. Ao contrário, devemos aprimorar, melhorar, ampliar, renovar, etc., etc. Claro que não estamos falando como um empreendedor, cujo maior pensador, Joseph Schumpeter (o grande economista vienense) afirmava que só pode ser chamado assim “um sujeito que após investir em um negócio, no auge do seu desempenho, quebra o investimento e parte para outro”. É bem verdade que o enunciado do grande economista em algumas situações não foi bem interpretado por certas pessoas, principalmente jovens acadêmicos. O certo é que todo empreendedor é, por excelência, um inovador. E se não fosse assim, ele não poderia ser chamado de empreendedor, mas sim empresário conservador.
Outro fato é que o significado da palavra conservador, especialmente no caso brasileiro, desde as últimas décadas do nosso império se tornou um vocábulo símbolo de algo velho, ultrapassado, anacrônico e coisa e tal. Nossos dicionários são responsáveis por isso. Na Europa, por exemplo, a expressão tem uma conotação direcionada a uma forte base moral. Na Inglaterra, principalmente, é tão robusta que deu até nome a um dos dois partidos políticos mais influentes da Grã-Bretanha. Sim Senhor, a peleja política inglesa há trezentos anos é praticamente decidida entre o Partido Trabalhista e o Conservador. Tendo este último produzido a mais proeminente de todas as figuras no campo político do Reino Unido: Winston Churcill. Não quero nem falar sobre as bandeiras defendidas pelos Conservadores, mas o fato é que eles são muito bem vistos e não é só naquele País (o Canadá, por exemplo, teve recentemente as suas eleições gerais ganhas pelos Conservadores). Viu aí?...
Esse rapapé todo é só prá dizer que nós, pelo fato de não entendermos bem e não sentirmos simpatia ao que cheira Conservadorismo temos desprezo por essa palavra. Porém, se a examinarmos sem prejulgamento, chegaremos a uma conclusão que uma dose certa de Conservadorismo (agora não apenas na política, mas sim na filosofia) não faz mal a seu ninguém. Dá até prá lembrar que sua rejeição nos fez cair em grotescas e desagradáveis esparrelas. Os enganos nos iludem. A força motriz desses enganos se observa pela janela de um obscuro idealismo, acompanhado de profunda ingenuidade xenofóbica, inexperiência histórica e visão aldeota de progresso. Histórica e filosoficamente sentimos que pela pressa de muitos atalhos, inúmeras lições deixaram de ser aprendidas. Em razão de termos pulado alguns capítulos do conhecimento, esses remates provocaram cavidades em nosso saber levando-nos a uma atitude preconceituosa em relação a validade do que fora construído por gerações que nos precederam. Os “progressistas”: proclamam: “Agora é hora de jogar pedra!”
Quando me censuram por elogiar alguém ou alguma coisa de Conquista, fico pensando: Eles querem que eu jogue pedra no que temos. Ou, pior, que eu destrua o que existe. Nada disso, meus caros. Não farei isso. Não serei o porta voz destrutivo de um mundo que a cada dia necessita de mais construtores. Serei sim, um modesto observador de um ambiente que comete barbarismos a todo instante. Não posso censurar este mundo. Sou apenas um dos anjos deficientes que nele habita. Procuro de forma insignificante dar pequenos palpites. Neste sentido, me lembro agora do que fizeram com a Companhia Cinematográfica Vera Cruz naqueles idos de 1950. A família Matarazzo trouxe para o Brasil uma equipe de grandes técnicos e diretores (Tom Payne e Adolfo Celli, entre eles) para transformar nossa cinematografia. Sairíamos de um cinema artesanal para um cinema industrial. Dito e feito. Foram produzidas algumas maravilhas de nosso cinema (dentre os quais o premiadíssimo O Cangaceiro). Imediatamente apareceram “os meninos” do Cinema Novo para detonar o projeto acabar com os sonhos de pessoas que só queriam fazer o bem para a nossa cultura. Fechando o balanço: Perdemos a Vera Cruz e o Cinema Novo - importante apenas pelas suas idéias maravilhosas - não teve competência empresarial para nos colocar na vanguarda da cinematografia mundial. O senhor Arnaldo Jabor [um dos detonadores da Vera Cruz] fez recentemente uma “mea-culpa” dizendo que não conseguia se desvencilhar de sua besteira infanto-juvenil. Pelo menos este aí [Jabor] aprendeu a não destruir o que está sendo construído. Se o que não temos não é lá muito bom, vamos nos esforçar para melhorá-lo. O próprio comentarista da TV Globo tem um enunciado na internet que diz assim: “Ser subdesenvolvido não é "não ter futuro"; é nunca estar no presente”. Ele aprendeu direitinho. Um abraço cordial e até a próxima.
Paulo Pires
(*) Professor UESB-FAINOR.
Na década de 1970, o grande Gilberto Freyre concedeu uma entrevista à extinta revista Realidade e na ocasião, ao ser solicitado pelo repórter como se situaria no âmbito de nossa intelligentzia, o autor de Casa Grande & Senzala, disse que se definia como um “anarquista construtivista”. Sim senhor, o grande Gilberto disse que era um homem de pouca crença nas instituições, mas mesmo assim, se considerava construtivista porque não havia outra saída.
Pessoas inteligentes são assim. Sabem que as coisas nunca são como deveriam ser. Mas, não vai ser por causa disso que devemos destruir o que existe. Ao contrário, devemos aprimorar, melhorar, ampliar, renovar, etc., etc. Claro que não estamos falando como um empreendedor, cujo maior pensador, Joseph Schumpeter (o grande economista vienense) afirmava que só pode ser chamado assim “um sujeito que após investir em um negócio, no auge do seu desempenho, quebra o investimento e parte para outro”. É bem verdade que o enunciado do grande economista em algumas situações não foi bem interpretado por certas pessoas, principalmente jovens acadêmicos. O certo é que todo empreendedor é, por excelência, um inovador. E se não fosse assim, ele não poderia ser chamado de empreendedor, mas sim empresário conservador.
Outro fato é que o significado da palavra conservador, especialmente no caso brasileiro, desde as últimas décadas do nosso império se tornou um vocábulo símbolo de algo velho, ultrapassado, anacrônico e coisa e tal. Nossos dicionários são responsáveis por isso. Na Europa, por exemplo, a expressão tem uma conotação direcionada a uma forte base moral. Na Inglaterra, principalmente, é tão robusta que deu até nome a um dos dois partidos políticos mais influentes da Grã-Bretanha. Sim Senhor, a peleja política inglesa há trezentos anos é praticamente decidida entre o Partido Trabalhista e o Conservador. Tendo este último produzido a mais proeminente de todas as figuras no campo político do Reino Unido: Winston Churcill. Não quero nem falar sobre as bandeiras defendidas pelos Conservadores, mas o fato é que eles são muito bem vistos e não é só naquele País (o Canadá, por exemplo, teve recentemente as suas eleições gerais ganhas pelos Conservadores). Viu aí?...
Esse rapapé todo é só prá dizer que nós, pelo fato de não entendermos bem e não sentirmos simpatia ao que cheira Conservadorismo temos desprezo por essa palavra. Porém, se a examinarmos sem prejulgamento, chegaremos a uma conclusão que uma dose certa de Conservadorismo (agora não apenas na política, mas sim na filosofia) não faz mal a seu ninguém. Dá até prá lembrar que sua rejeição nos fez cair em grotescas e desagradáveis esparrelas. Os enganos nos iludem. A força motriz desses enganos se observa pela janela de um obscuro idealismo, acompanhado de profunda ingenuidade xenofóbica, inexperiência histórica e visão aldeota de progresso. Histórica e filosoficamente sentimos que pela pressa de muitos atalhos, inúmeras lições deixaram de ser aprendidas. Em razão de termos pulado alguns capítulos do conhecimento, esses remates provocaram cavidades em nosso saber levando-nos a uma atitude preconceituosa em relação a validade do que fora construído por gerações que nos precederam. Os “progressistas”: proclamam: “Agora é hora de jogar pedra!”
Quando me censuram por elogiar alguém ou alguma coisa de Conquista, fico pensando: Eles querem que eu jogue pedra no que temos. Ou, pior, que eu destrua o que existe. Nada disso, meus caros. Não farei isso. Não serei o porta voz destrutivo de um mundo que a cada dia necessita de mais construtores. Serei sim, um modesto observador de um ambiente que comete barbarismos a todo instante. Não posso censurar este mundo. Sou apenas um dos anjos deficientes que nele habita. Procuro de forma insignificante dar pequenos palpites. Neste sentido, me lembro agora do que fizeram com a Companhia Cinematográfica Vera Cruz naqueles idos de 1950. A família Matarazzo trouxe para o Brasil uma equipe de grandes técnicos e diretores (Tom Payne e Adolfo Celli, entre eles) para transformar nossa cinematografia. Sairíamos de um cinema artesanal para um cinema industrial. Dito e feito. Foram produzidas algumas maravilhas de nosso cinema (dentre os quais o premiadíssimo O Cangaceiro). Imediatamente apareceram “os meninos” do Cinema Novo para detonar o projeto acabar com os sonhos de pessoas que só queriam fazer o bem para a nossa cultura. Fechando o balanço: Perdemos a Vera Cruz e o Cinema Novo - importante apenas pelas suas idéias maravilhosas - não teve competência empresarial para nos colocar na vanguarda da cinematografia mundial. O senhor Arnaldo Jabor [um dos detonadores da Vera Cruz] fez recentemente uma “mea-culpa” dizendo que não conseguia se desvencilhar de sua besteira infanto-juvenil. Pelo menos este aí [Jabor] aprendeu a não destruir o que está sendo construído. Se o que não temos não é lá muito bom, vamos nos esforçar para melhorá-lo. O próprio comentarista da TV Globo tem um enunciado na internet que diz assim: “Ser subdesenvolvido não é "não ter futuro"; é nunca estar no presente”. Ele aprendeu direitinho. Um abraço cordial e até a próxima.
Paulo Pires
(*) Professor UESB-FAINOR.
2 comentários:
Simplesmente magnífica sua sensibilidade e criatividade literária. Paulo você tem muitos leitores e admiradores. Incluo-me entre eles!
Um abraço,
Ezequiel Sena
Paulo,
Todos nos gostamos de dar palpites. É claro que existe momentos que concordamos com os elogios ou descordamos.
E por falar em elogiar.Concordo plenamente com ezequiel sena, vc tem muitos leitores que te admiram. Iclusive eu.
Leio todos os dias os textos.
abraço.
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