sexta-feira, 17 de outubro de 2008

Academia do Papo


Coisas sem nexo (?)

Do grande humorista brasileiro Millôr Fernandes: “Democracia é eu mandar em você; Ditadura é você mandar em mim”. Pronto, eis aí um dos pomos da questão política, social e econômica do mundo contemporâneo. O que vale prá mim, não vale prá você. Diante do quadro atual e da insanidade que toma conta do mundo, creio ser o momento de nos expressarmos humoristicamente sobre esse bicho chamado Mercado. Quando ele está em alta logo aparecem os seus advogados (economistas e financistas liberais) defendendo-o como a mais competente de todas as Instâncias da Sabedoria Humana. Os Lucros exorbitantes, exaltam os seus defensores, são frutos da enorme competência que o Deus Mercado tem para saber acumular, avaliar, aplicar, controlar e movimentar. Saudemos, pois, os Fluxos de Capitais. Que maravilha! Há apenas um pequeno porém: Nem tudo na vida são flores. E esse porém chama-se Risco. Quando ele chega, o Mercado se retira e espalha em todas as mídias: Estamos em baixa, portanto é hora de o Estado assumir a debacle. Eis aí a lógica do Mercado. A Lógica, outrora um dos campos mais belos da filosofia clássica, morreu em 1951, segundo o alemão Ludwig Wintgstein. E não foi à toa que ele afirmou isso. O alemão está acompanhado de outras pessoas ilustres. O professor Delfin Neto, por exemplo, é uma delas. Recentemente o ex-ministro disse que se um político quiser ver seus projetos morrerem no Congresso Nacional, basta tentar usar argumentos lógicos. Pode uma coisa dessas?


O caso dos bancos brasileiros é digno da Arte Nonsense e um belo exemplo de que a lógica clássica morreu. Os nossos banqueiros sempre sustentaram que cobravam juros altos por causa do spread e do depósito compulsório que o Banco Central exigia deles. Mentira. Eles mesmos se incumbiram da contradição. Nos últimos dias o governo liberou R$ 160 bilhões do compulsório, e os juros, por incrível que pareça, subiram! Que diabo está havendo? O spread bancário tem justificativas indecorosas. Mas alguém tem que pagar o pato. E esse alguém é a sociedade. O cidadão simples, trabalhador, aquele que não ludibria ninguém e que tem uma carga de impostos embutida nos produtos e no contracheque que recebe, não escapa do Imposto.

Grandes empresas brasileiras declararam esta semana haver perdido enormes somas de dinheiros com a antecipação dos Adiantamentos de Créditos de Câmbio (ACC). E o que é que temos a ver com isso? Quer dizer, o sujeito entra cheio de usura em seus negócios, recebe a dinheirama toda, enfia os zilhões de dólares no Caixa e depois que a coisa degringola, somos nós que temos que pagar pela sua ganância? Como dizia um velho compositor baiano: “Alguma coisa está fora da ordem”. Todos os manuais de Economia e Finanças têm capítulos dedicados a Riscos. Riscos são eventos que colocam o investidor, o aplicador, numa situação de advertência sobre ganhar ou perder. Esses manuais alertam: Quanto maior for o endividamento da empresa ou do País, maior será o seu risco. Para ilustrar cito o professor Iqbal Mathur (Southern University Illinois at Carbondale): “Todos devem saber que ao se fazer um negócio, deve-se ter muito claro que entre os Investimentos e os Financiamentos, intercede um elemento real chamada Risco”. Claro. O risco é inerente a toda atividade humana. Em nossas vidas a coisa funciona mais ou menos assim. Tudo o que fazemos e em tudo que nos metemos há um funcionamento mecânico semelhante ao de um jogo de dados, como dizia poética e filosoficamente o grande simbolista Stephane Mallarmé. No caso específico, os grandões que perderam insistem que o Governo tem que ressarci-los pelas perdas. E nós, os pequenos, quando sofremos perdas, o Governo nos recompensar?

O que mais admiro - quero dizer detesto - no mundo financeiro são as expressões do jargão técnico de suas operações. Capital Volátil, Mão Invisível, Mercado Nervoso, Queda nas Operações, Empoçamento, Hipótese do Mercado Eficiente (quem acredita mais nessa?), Valor Justo. Risco País. Estresse do Mercado, etc.etc.

Ninguém fala de ética, humanismo, vergonha, bagunça financeira, sacanagem monetária, vagabundagem econômica, justiça social, desigualdades, respeito, terrorismo financeiro, enriquecimento ilícito, pilantragem. Todas essas palavras foram varridas do ambiente do Mercado. A maioria dessas expressões tem um cunho moral muito forte. E a moral, francamente, não é bem vista no Mundo Financeiro. O Mercado ri dessas expressões. Na visão dos seus operadores quem as utiliza são trouxas, otários, ingênuos, primitivos. Quer saber? Quem tava certo mesmo era o poeta Manuel Bandeira que enojado do que via, bradou poeticamente: Vou-me embora prá Pasárgada! Eu também quero ir, seu Bandeira. Lá nos encontraremos e já que você é amigo do Rei, aproveitarei sua benevolência para andar de bicicleta e deitar numa cama com a mulher que eu escolherei. Tchau mundo horrível. Tchau bandidos do Mercado. Como disse Saddam Hussein para os seus algozes: Vão para o Inferno! Até a próxima e um cordial abraço. Paulo Pires
(*) Professor UESB-FAINOR.

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